Pensando um pouco sobre a solidão

O objetivo do homem não é a solidão. Se o fosse, então a natureza lhe concederia em vão o instinto de reprodução. É impossível a ele o total isolamento de seus semelhantes. Pode ocorrer um afastamento parcial, nada, além disso. O objetivo dele é outro, não quer dizer que não possa optar pela solidão.
Se o homem não consegue viver bem sem a presença de outro, é de se supor que ele seja incompleto. Assim, encontra-se nele um vazio que deve ser preenchido com a existência de mais homens.
Muitas são as causas naturais que contribuem para a sua dependência em outro ser da mesma natureza. O homem quer sentir, e não o pode sem que alguém o faça. De fato, se convive entre homens, pensa como tal; se conviver só entre animais, tende a ceder a esta natureza.
Querer a plena solidão, indo para onde não haja semelhantes, é um desejo que evidencia a repulsão pela sua própria natureza, tal como um homem que abandona a sua cultura por amor a cultura vizinha.
Viver sem outra pessoa não é bom. Isso é não ter existência! Para que então serve a solidão, e por que a buscar, já que é impossível encontrá-la, ou então, uma vez que é inevitável a suposta conversão da espécie em outra? Não se pode ser cidadão de diversas nações. Até se pode participar de todas, mas nunca ao mesmo tempo.
Para ser útil a solidão, o propósito para a sua pratica é o melhor possível. Ter desinteresse pela própria espécie e afastar-se dela para além é loucura. Existem diversas espécies. Não há como confrontar com todas, evitando-as. Logo, se o homem vir a evitá-las, não pode sobreviver por muito tempo. Necessita delas para manter em atividade sua vida orgânica.
Pode ser dito acerca daquele que detesta a sua natureza que um aborto seria melhor que ele. A imperfeição humana não garante o direito de ser repudiada. Ela, a imperfeição, não é um estado, apenas uma condição. Pode, como deve, ser governada! Criam-se oportunidades! Em vez de sofrer a ação, o homem é capaz de executá-la!
A solidão não é boa nem má. É indiferente a tais coisas. Ela não pode ser odiada, merece compreensão. Ela não é um efeito, mas o seu experimento provocará uma causa. A solidão é má quando é exercida quer por um repudio à própria natureza, quer pelo temor dos semelhantes. É boa, e deve ser posta em prova, para dar individualidade, a personalidade que cada homem necessita ter para se afirmar de forma integral sem a dependência de outro. A solidão individualiza, dá forma ao ser. Dá ao homem nome e originalidade.